SÃO PAULO  -  Prepare-se: amanhã, o presidente da empresa pode sentar ao seu lado. Em busca de mais produtividade, transparência no trabalho e  maior velocidade na tomada de decisões, algumas corporações estão aposentando as salas fechadas dos CEOs. A palavra de ordem é eliminar barreiras hierárquicas e oferecer um ambiente que favoreça a comunicação do principal líder da organização com os demais gestores. Segundo especialistas em recursos humanos e escritórios de arquitetura, companhias de tecnologia, serviços e finanças lideram a adoção desse novo modelo de gestão.

Na empresa de cartões de benefícios Alelo, com 550 funcionários no Brasil, a estratégia tomou corpo em 2015, quando o grupo ganhou uma nova sede, em Barueri (SP). “A ideia é promover  maior colaboração entre as equipes”, diz o presidente Eduardo Gouveia, que, antes da mudança, trabalhava em uma sala fechada, com outros diretores. O local era chamado pelos colaboradores, de brincadeira, de Olimpo. “Essa separação me incomodava e não transmitia a imagem adequada que a corporação deveria ter.”

Hoje, Gouveia cumpre expediente ao lado dos funcionários, com mesa e cadeira iguais aos outros profissionais. Senta ao lado da secretária, entre as equipes de planejamento estratégico e de gente e gestão. O ambiente dispensa divisórias, baias ou elementos de decoração que individualizem as áreas. Com isso, gerentes e diretores acompanharam o chefe. “Todos trabalhamos juntos e cada líder usa mesas coletivas com seus times, sem limites de sala.”

Para ele, a maior vantagem da mudança está no modo “como fazer as coisas”. “As minhas decisões e as dos diretores são de interesse de todos e devem ser feitas abertamente.” No dia a dia, houve um reforço no trabalho em equipe e redução de formas tradicionais de contato, como o e-mail. “Há menos reuniões formais, muitas delas improdutivas, e os executivos vão até os colegas, agora mais próximos e acessíveis, para resolver assuntos de forma ágil.”

Com o chefe à vista, a empresa registrou um crescimento no nível de engajamento dos colaboradores. A pesquisa interna de clima subiu 16 pontos, e a percepção de que os funcionários se importam uns com os outros teve 82% de aceitação. “Há mais ‘troca’ pessoal. Quebramos barreiras com a aproximação dos departamentos.”

Gouveia lembra que o compartilhamento do espaço exige uma nova postura. Conversas em voz baixa e mais discernimento sobre temas que devem ser tratados com discrição ganharam força. Para isso, há salas privadas para reuniões e cabines telefônicas são usadas durante ligações confidenciais. Encontros com clientes e fornecedores são transferidos para pontos reservados. “O escritório foi concebido para ser o mais informal possível, com salas abertas e mesas que podem ser usadas por colaboradores que trabalham em home office e se deslocam para a matriz com menos frequência.” 

Ana Cláudia S. Reis, sócia da consultoria de recursos humanos Caldwell Partners no Brasil, afirma que os ambientes colaborativos acompanham uma tendência que ganha impulso com um cenário econômico desafiador. “Organizações que aderem ao modelo de atuação integrada, aproximando o CEO do quadro de pessoal, tendem a ganhar produtividade e reduzir ‘gaps’ nas rotinas de trabalho. Isso potencializa a eficácia de processos decisórios e a resolução de problemas”, analisa. “Ao mesmo tempo, times que atuam em escritórios conjuntos tendem a ser mais criativos.”

Os desenhos mais assertivos desse tipo de gestão, segundo ela, situam-se entre os escritórios tradicionais, com salas reservadas para a diretoria, e os “open spaces”. “Deve-se buscar um meio-termo entre a privacidade do escritório individual e o espírito de cooperação das baias abertas.”

Há 22 anos no mercado, o escritório de arquitetura Athié Wohnrath assinou projetos que aposentaram a sala da presidência em corporações como Dow Química, Votorantim Cimentos e Brasil Plural, do setor financeiro. “É um tipo de gestão integrada que se torna cada vez mais frequente”, atestam os sócios Sérgio Athié e Ivo Wohnrath. “Esse movimento teve origem há pelo menos sete anos, com os bancos de investimento, e hoje é uma realidade para empresas de varejo, de comunicação, energia e farmacêuticas. No momento em que o CEO sai de um ambiente fechado, ele transmite para o time a mensagem de que está disponível e conectado às atividades da companhia.

Anna Melo, office manager da empresa de recursos humanos Randstad Professionals, no Rio de Janeiro, diz que o isolamento do CEO pode causar ruídos na comunicação interna das organizações. A consultora lembra que, por questões culturais e de agenda, o número 1 de uma operação se distancia naturalmente dos liderados. “Mas, quando o principal executivo divide o mesmo espaço de ação com o restante da equipe, o time inteiro fica mais afinado.” Hoje, grupos de tecnologia, de desenvolvimento de produtos, marketing e serviços, que têm como principal matéria-prima a informação, perceberam a importância de eliminar as portas fechadas.

Na Ascenty, empresa de data center com 250 funcionários, o CEO Chris Torto é adepto do trabalho em grupo desde a criação da companhia, em 2010. Antes de assumir a operação, dividia uma sala de cerca de 10 metros quadrados com alguns diretores. “Agora, procuro estar em um ponto central do escritório. Consigo monitorar os atendimentos e o desempenho dos nossos serviços em tempo real. A empresa era uma startup e precisávamos de uma comunicação fluida entre as equipes, sem paredes ou divisórias.”

Na matriz da empresa, em Campinas (SP), com 600 metros quadrados, onde, além de Torto, trabalham cerca de 70 executivos de áreas como marketing, atendimento e telecomunicações, e colaboradores do financeiro, tecnologia e compras. “Como a minha presença aqui é constante desde o início da companhia, a ‘novidade’ sempre foi vista de maneira natural por todos.”

Com o fundo de private equity americano Great Hill Partners entre seus principais investidores, a Ascenty, apesar do pouco tempo de mercado, inaugurou quatro data centers próprios, em São Paulo e no Ceará, e tem mais três unidades em construção, em Osasco (SP), Rio de Janeiro e Santiago, no Chile. Torto diz que a previsão para 2016 é crescer até 120% em relação ao ano passado, mesmo com a recessão. 

“Com os funcionários trabalhando lado a lado no escritório, as ideias fluem mais rápido e a necessidade de realizar reuniões ficou menor”, diz. “No caso de aparecer um problema em um projeto, a comunicação é feita de forma imediata, sem a necessidade de aguardar pela formalidade de um encontro.”                  

Flávio Batel, country manager no Brasil da firma americana de mobiliário corporativo Steelcase, com mais de cem anos de mercado, afirma que o fim das salas dos CEOs pode render bons resultados de gestão, mas não basta apenas mudar as cadeiras de lugar. “É preciso promover a interação e a colaboração dos grupos de trabalho.” Segundo Batel, não é a ausência do QG da presidência que vai influenciar os rumos das corporações, mas o exemplo dado pelo CEO nos corredores. “Em algumas companhias, o líder se senta ao lado de estagiários para desenvolverem trabalhos juntos.”           

A Steelcase realizou uma pesquisa no Brasil com 810 profissionais e constatou que 47% dos entrevistados têm a opção de mudar de local, dentro da empresa, quando precisam realizar uma determinada tarefa. “Em outros países, esse percentual chega a 51%. Ainda temos um caminho a trilhar.”

Alguns consultores acreditam que o excesso de conexão física entre o CEO e os demais gestores pode ser prejudicial. Apesar da proximidade influenciar positivamente no engajamento, é importante que o executivo-chefe tome alguns cuidados com a comunicação intensa, avalia José Augusto Figueiredo, presidente da consultoria LHH no Brasil. “Deve-se estabelecer regras de convívio entre as partes e observar o que os funcionários sentem diante desse novo tipo de comando.”